07/07/2015

Após repetir sete vezes na escola, assistente social planeja pós-graduação


O assistente social Kelio Vilarindo Pereira, 32, repetiu sete vezes a 1ª série do ensino fundamental –não conseguia entender o conteúdo das aulas. Embora tivesse diagnóstico de epilepsia, a doença não era o que o atrapalhava.
Quando chegou na 2ª série, aos 14, começou a receber ajuda extra nos estudos. Terminou o ensino fundamental e o médio em apenas quatro anos. Fez faculdade e se formou no ano passado.

Entrei na escola cedo, na educação infantil. Na minha casa, sempre valorizamos a educação. Minha mãe inclusive trabalhava em uma escola como funcionária do administrativo. Mas logo no começo do ensino fundamental começaram os meus problemas.
Repeti sete vezes seguidas o primeiro ano e só cheguei ao segundo com 14 anos de idade. Eu não entendia o conteúdo das aulas, não entendia o que aquilo tinha a ver com a minha vida, não conseguia memorizar nada. Então todos os anos eu repetia e começava de novo.
Estudava em uma escola da prefeitura da minha cidade, Porto Nacional (a cerca de 50 km de Palmas, capital do Tocantins; a cidade tem cerca de 50 mil habitantes e 27 escolas municipais -quase metade delas rurais).
Tenho dois irmãos, e eles nunca tiveram problema na escola. Minha família sempre me apoiou e me incentivava a seguir na escola cada vez que eu repetia, mas tinha gente ao meu redor tentando me desestimular. Todo mundo tinha dó de mim, achavam que eu não seria ninguém. Eu sempre achei que chegaria em algum lugar. Eu só não entendia o conteúdo das aulas.
Logo que comecei a estudar, ainda na escolinha, aos quatro anos, fui diagnosticado com epilepsia. Minha doença me atrapalhava muito, toda hora eu tinha crise de convulsão.
Cheguei ao ensino fundamental na idade certa, aos sete anos. Na escola, todo mundo sabia do meu problema de saúde, mas ninguém fazia nada específico para me ajudar. Eu repetia de ano e continuava na escola, a cada ano com colegas cada vez menores.
Nunca pensei em parar de estudar, mas eu não tinha ideia de como poderia prosseguir. O verbo “desistir” nem existe no meu dicionário. Sempre quis fazer faculdade e sempre achei que conseguiria, então insisti muito mesmo para continuar estudando.
O problema é que eu já era adolescente e ainda estava no segundo ano do fundamental. Então minha família começou a procurar ajuda. Por indicação de uma tia, comecei a frequentar umas aulas de apoio do Instituto Ayrton Senna na minha cidade, que me ajudavam a entender o conteúdo da escola.
Aprendi a escrever, aprendi matemática, consegui entender o que eu estava sendo ensinado na escola. Os professores começaram a me olhar como alguém que poderia aprender. As aulas me mostravam onde eu estava errando.
Isso funcionou como um trampolim para mim: em quatro anos, eu concluí o ensino fundamental e o ensino médio. Fiz isso em menos da metade do tempo regular da escola, que seriam mais nove anos -isso se eu não repetisse mais.
Aos 19, ainda antes de terminar o ensino médio, eu entrei no curso de administração da Faculdade Objetivo. Todo mundo ficou abismado, ninguém acreditava que eu chegaria na faculdade. Na verdade, até hoje muitas pessoas ainda não se conformam com isso.
Depois, acabei mudando para outro curso, serviço social, na Unopar (Universidade do Norte do Paraná), e me formei no ano passado. Agora estou estudando para concurso público porque quero trabalhar na área. Quero continuar estudando, também estou pensando em fazer uma pós-graduação.
Hoje, não fico olhando muito para trás e pensando nas barreiras que superei, não fico pensando onde eu estaria hoje se não tivesse tido ajuda para superar a dificuldade logo na primeira série da escola.
Acho que, mesmo com alguma dificuldade ou doença, as pessoas conseguem chegar longe se tiverem algum tipo de apoio. Mas a pessoa tem de querer vencer suas próprias dificuldades, senão ela nunca vai conseguir sair do lugar. Se você não tiver confiança em você mesmo, então você não vai chegar em lugar nenhum.

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