“Minha
Vida de Menina” foi uma das leituras mais leves e divertidas de 2020. Você pode
conferir as melhores leituras neste post aqui. Eu recomendo, principalmente
para quem quer começar a desenvolver o hábito da leitura.
A obra fez parte da lista de livros da FUVEST entre os anos de 2017 e
2020, surpreendendo e agradando muitos professores de literatura. Esse registro
biográfico é importante tanto para a história do Brasil, por conta das
informações daquele período, quanto para a literatura nacional. Vários autores
se impressionaram com a obra, dentre os quais eu destaco Guimarães Rosa.
Esse
é um livro que já nasceu clássico, é uma obra muito estudada. Em uma pesquisa
rápida que fiz no Google, só na primeira página encontrei 5 dissertações de
mestrado e uma tese de doutorado, para vocês verem o nível de importância dessa
obra.
“Minha
vida de Menina” foi escrita por Helena Morley, que é o pseudônimo de Alice
Dayrell Caldeira Brant, ela nasceu em Diamantina, cidade do interior de Minas
Gerais, em 1880. A 1ª edição dessa obra foi publicada em 1942, quando a autora
tinha 62 anos. Esse livro é parte do diário de Helena escrito de janeiro de
1893 até dezembro de 1895, quando ela tinha entre 13 e 15 anos.
Helena
é filha de Alexandre e Carolina. Alexandre era de família inglesa e
protestante, Carolina, mineira e católica. Ela teve 3 irmãos, Renato, o
primogênito, Luisinha, irmã mais nova que ela, e Joãozinho, o caçula. A família
de sua mãe era da região de Diamantina, onde moravam a maioria dos seus 11 tios
e os inúmeros primos com quem ela convivia diariamente.
Nesta
época o Brasil tinha acabado de abolir a escravatura, fato que ocorreu em 1988
e o atual presidente da república era Floriano Peixoto. Diamantina fica cerca
de 290 km de Belo Horizonte, e se desenvolveu a partir das lavras de garimpo de
diamante no início do século XVIII. No período em que Helena viveu, já não se
encontrava mais diamantes como antigamente.
A
sociedade brasileira “livre” me chamou bastante a atenção. Livre porque como os
antigos escravos foram libertos, mas sem nenhum auxílio, grande parte dessas
pessoas continuaram morando nas senzalas. A avô de Helena continuou com alguns
negros na chácara, pois eles não tinham para onde ir.
Alguns
tios da Helena mantinham a ideia de que o trabalho deveria ser feito só por
negros e não deixavam os filhos trabalharem, queriam que seus filhos virassem
doutores, então não permitiam que eles carregassem nenhum pacote na rua, por
menor que fosse. O pai de Helena já não pensava assim, falava que o trabalho é
honroso, fazia com que todos trabalhassem, cada um na sua atividade.
O que
dá para perceber a partir dos registros de Helena é que ela era uma menina
muita esperta e criativa, com muitas ideias e questionamentos. Ela não ia bem
na escola, mas tinha uma sagacidade para vida. Além de ser uma menina com um
coração muito bondoso.
O pai
de Helena estava sempre investindo todo o pouco dinheiro que eles tinham na
abertura de novas lavras, procurando diamantes, mas nunca encontrava. Sempre
que conseguia algum dinheiro, continuava gastando no garimpo. Por conta disso,
a família passava por algumas necessidades e acabava dependendo da avó materna,
que possuía uma condição melhor. Isso gerava alguns conflitos, o que é comum na
maior parte das famílias.
Toda
família possui membros que são mais próximos do que outros, tem sempre o
queridinho da mamãe e Helena era a queridinha da vovó Theodora. Ela sabia disso, aproveitava um pouco,
mas também reclamava de tanta atenção: Mudança na rotina quando ficava na casa
da avó, a vontade que ela coma mais para poder engordar, e a cobrança em
algumas questões religiosas.
No casarão
de dona Theodora, ocorriam as reuniões de família. Nas entradas do diário são
contadas várias dessas reuniões familiares e as brincadeiras de Helena com seus
primos. Essa é uma das partes mais característica de Minas Gerais, a meu ver.
Família e agregados reunidos, comida gostosa e muitos causos para contar. Sei
que isso pode existir em outros locais, mas é que em Minas Gerais isso é generalizadamente
comum.
Helena
era “Normalista” e uma de suas tias, a tia Madge, irmã de seu pai, estava
esperando que ela se formasse para trabalhar como professora. Essa tia Madge é
um caso de amor e ódio e é muito engraçado ver a relação das duas: A tia
querendo fazer o bem para a sobrinha e Helena achando que algumas coisas eram
implicações.
Helena
não era uma aluna de notas altas, gostava mais de estar na rua brincando e
passeando, do que estar em casa estudando. O diário foi um incentivo do
professor de português que sempre pedia que os alunos escrevessem uma
“redação”, que poderia ser uma descrição, carta ou narração. Helena dizia que
poderia sair da escola sem saber matemática, química e física, mas não sairia
sem saber escrever.
Esta menina
era muito questionadora, no livro vamos nos deparar com várias questões nos
diferentes aspectos da vida. Por exemplo no âmbito religioso ela perguntou para
a sua avó:
“Vovó, já tem tanto tempo que vovô, meus tios e esta gente toda morreu! Pois se eles estão esse tempão todo no purgatório, já devem estar acostumados, e não adianta a gente ficar até hoje rezando de joelhos tanto tempo, como Chininha quer”.
Essa
leitura funciona como uma viagem cultural. Através desse livro você poderá
conhecer a vida mineira do século XIX. Como era a organização da sociedade, o
papel do homem, da mulher, das crianças e até mesmo da igreja. São muitos os
costumes que conhecemos e alguns costumes que perduram até hoje.
No
prefácio da 1ª edição a autora deixa uma mensagem para suas netas e que serve
para todos nós:
Agora uma palavra às minhas netas. — Vocês que já nasceram na abastança e ficaram tão comovidas quando leram alguns episódios de minha infância, não precisam ter pena das meninas pobres, pelo fato de serem pobres. Nós éramos tão felizes! A felicidade não consiste em bens materiais mas na harmonia do lar, na afeição entre a família, na vida simples, sem ambições — coisas que a fortuna não traz, e muitas vezes leva.
São
muitos os relatos divertidos aqui e creio que é possível através dessa leitura,
se divertir, alegrar, aprender e refletir. Tudo isso a partir da inocência de
uma criança.
Resenha
escrita por
Wesley
Ximenes
Livro –
Minha vida de menina
Autor –
Helena Morley
Editora –
Companhia de Bolso
Páginas –
325
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